domingo, 25 de agosto de 2013

A dimensão humana do correr

Pelo segundo ano consecutivo, corri, neste domingo (25), a Meia Maratona Internacional de Belo Horizonte que, este ano, chegou à sua quarta edição. 

Segundo os organizadores da prova, um dos atrativos desta meia - que, atualmente, é a única com o percurso de 21.197 km realizada em Beagá, o que é um fato lamentável, sobretudo para os amantes da corrida -  está no fato de parte do percurso (3 quilômetros) ser realizado dentro do Zoológico. 

Para tanto, a cada ano é escolhido algum animal para ser, digamos, "homenageado" - quase sempre é um bicho que está em risco de extinção. Em 2013, o  premiado foi o gavião real.

Este ano, a Meia Maratona Internacional
de BH homenageou o Gavião Real

No site de divulgação da prova está a explicação: "A caça e o desmatamento são as principais ameaças ao Gavião Real. A despeito do tamanho e da força, o gavião real é frágil. Reza a lena na floresta que a ave de garras afiadas ataca pessoas e come crianças, o que infelizmente estimula a sua matança. O avanço da fronteira agrícola e da retirada de madeira para a venda é outro fator de risco, uma vez que a espécie precisa de grandes áreas preservadas para sobreviver e só entrelaça o ninho das árvores mais ascendentes. Para resguardá-la, não resta outro caminho que não a conscientização".

Na verdade, afora o fato de o Zoológico ser um lugar realmente muito bonito - arborizado, sobretudo - sigo sem entender a lógica da escolha do local para que corredores tenham que passar por ali. Isto, por pelo menos dois motivos.

Explico o porquê da minha opinião. 

Com exceção deste que vos escreve - que tem mania de correr com a máquina de fotografar nas mãos, para captar tudo o que vê pela frente e que não encara a corrida como uma competição, mas como um grande prazer de observar a vida e as coisas, para, depois, tentar "poetizar" -  aqueles que estão correndo não prestam muita atenção nos bichos, tampouco ganharão mais um bocado de conscientização pelo simples fato de correrem parte do percurso ali dentro.  Eles querem mesmo é competir, superar os próprios recordes pessoais, diminuir o tempo de uma prova em relação a outra.

A girafa não apareceu
Em alguns momentos
parecia uma floresta
A segunda razão é que penso tal como os ambientalistas, embora não seja um deles: correr dentro do Zoológico me parece ser um motivo a mais para estressar os bichos - principalmente os que já estão acordados, que ali estão, creio eu, para ter um pouco de sossego ou para fugir da sanha depredatória dos humanos, afinal de contas, o ser humano, que, aliás, anda tão desumano, é dos bichos mais estranhos que conhecemos. Se um humano mata e maltrata um outro ser humano, porque ele não faria isso com um animal indefeso, não é mesmo? (Então, não custa nada mesmo perturbar um pouco os animais, com aquela correria danada dentro do zoológico, com o bater contínuo, forte e incansável de pés dos corredores no chão). 

Percurso no Zoológico foi de
 cerca de 3 quilômetros

Por isso, mais uma vez, a exemplo do que ocorreu no ano passado, foi impossível não me recordar da estupenda "Passaredo", música de Chico Buarque e Francis Hime, que, escrita ainda nos idos dos anos 80, na minha modesta leitura, já era uma espécie de alerta contra a ação do homem sobre os bichos. Tanto é que o refrão é bem elucidativo: "...bico calado, muito cuidado que o homem vem aí". Com exceção do elefante, que pude ver, acho que os outros  bichos resolveram seguir o conselho dos poetas e ficaram refugiados, de bico bem calado, em suas jaulas...

Correr é animal
Todavia, como a corrida para mim é, também, um momento de grande reflexão sobre a vida e as coisas que a cercam, ao saber que o gavião real era o "homenageado" da vez, lembrei-me de um livro que li há muitos anos: "A águia e a galinha, uma metáfora da condição humana", de Leonardo Boff.

Nesta bela obra, Boff faz uma reflexão sobre os caminhos e descaminhos do ser humano na busca de sua própria identidade - foi aí que me lembrei que, certa vez, escrevi aqui mesmo neste blog que a corrida ajuda a me conhecer um pouco melhor: a corrida é autoconhecimento.

Valendo-se de muitas metáforas, Leonardo Boff diz que nós, ao vermos uma galinha e uma águia, estamos vendo muito mais que simplesmente uma águia e uma galinha, pois, segundo ele, estas são duas dimensões fundamentais da existência humana.

Pampulha é sempre um lugar inspirador 

Na minha humilde opinião, é muito bonito, poético, inspirador, instigante e encorajador o que nos diz Boff.

Para ele, o que simboliza a galinha é "a dimensão do enraizamento, do cotidiano, do prosaico, do limitado". Em contrapartida, a dimensão da abertura, do desejo, do poético e do ilimitado é o que simboliza a águia (ou o gavião real). 

A corrida nos dá muitos exemplos de fé,
determinação e superação, coisas
que todos podem ter
Ou seja, em outras palavras, o que o autor nos diz é que dentro de cada um de nós há uma dimensão galinha e uma dimensão águia e que nossa tarefa é conseguir equilibrar os dois pólos afim de fazer o que ele chama de "arranjo existencial". Lindo isso, não é mesmo?

Cada um tem um motivo para correr:
encontre o seu!

Portanto, correndo hoje (sim, eu consigo pensar nisso tudo enquanto corro), pensei também que realmente depende de cada um de nós ter a águia como metáfora para aspirar a uma vontade infinita de voar e de transcender para além do normal ou, então, nos ocuparmos unicamente da nossa dimensão galinha, sem sair do cotidiano, do trivial, do banal.
Na corrida é você quem
 define seu caminho

Na verdade, penso que o que a vida corrida que levamos quer (e exige) de todos nós é mesmo o que nos sugere Boff: "... somos galinhas, seres concretos, históricos. Mas jamais devemos esquecer nossa abertura infinita, nossa paixão indomável, nosso projeto infinito: nossa dimensão-águia!"

Sem o brilhantismo e a inteligência de Boff, era mais ou menos isso que eu já quis dizer aqui neste corridaemprosaeverso.blogspot.com.br  quando escrevi que "a corrida nos leva além" e que "pela corrida, somos capazes de transcender". Ou seja, no meu modo de encarar a corrida, penso que ela pode mesmo nos levar, metaforicamente, por caminhos que não conhecemos e até chegar onde, talvez, jamais pensávamos poder chegar.  A corrida também é filosofia.

Particularmente nesta Meia Maratona Internacional de Belo Horizonte, então, a corrida me deu a grata oportunidade de refletir sobre meus caminhos pela vida afora e acerca da nossa condição águia - que, por vezes, parece adormecida, dando mais vazão à dimensão galinha -  mas, também, de acreditar que o homem, bicho que é por natureza, ao caminhar ou correr pela vida, o faça de maneira mais amável, paciente, sensível, gentil, com mais fé e esperança, sendo menos animal do que tem sido. 


Um abraço a todos.

Vamos correr!


terça-feira, 9 de julho de 2013

Nunca mais

"Tenha coragem para as grandes adversidades da vida e 
paciência para as pequenas, e quando 
tiver cumprido laboriosamente 
sua tarefa diária vá dormir em paz. 
Deus está acordado."


Depois de correr mais uma maratona, agora sim posso dizer: Nunca mais!

Nunca mais direi que não consigo.
Nunca mais direi que não posso.
Nunca mais direi que é impossível.
Nunca mais direi que não tenho força.

Maratona no Rio: cenário que inspira


Nunca mais direi que não consigo, que não posso, que é impossível e que não tenho força. Eu consigo. Eu posso. Tudo me é possível. Eu tenho força. E que tudo isso sirva como exemplo para qualquer coisa que eu fizer na minha vida. E ainda há muito por fazer! A corrida é o exercício da autoconfiança!

De onde vim e para onde vou

Nunca mais vou me esquecer de que posso tudo aquilo que eu desejar (desejo é uma palavra linda), desde que eu realmente queira, do fundo do meu coração, e que tenha condições para fazer aquilo que me propuser a fazer.

Nunca mais direi que senti medo.
Com medo, certamente, eu não estaria ali.
Mas, ainda que alguma vez eu sinta medo,
com medo mesmo eu irei.
Lá, o medo acaba!

A corrida é um exercício de admiração 

Nunca mais direi que não tenho coragem.
Guimarães Rosa já sentenciou, poeticamente: “o que a vida quer da gente é coragem!”

Nunca mais me esquecerei de que senti muitas dores:
nas pernas, nos braços, no pescoço, no corpo todo.

Dor até mesmo na alma.

Sentir dor faz parte. Faz parte da corrida.

Sentir dor faz parte da vida. Não se vive sem dor.

Mesmo porque toda dor tem seu prazer. Também é assim no amor!

Tanta gente, tantas pernas, tantos estilos diferentes

Nunca mais vou me esquecer dos tantos corredores ou corredoras que se esticam no chão, se contorcendo com dores musculares e câimbras, mas que, daí a minutos, se erguem e continuam a correr. Há alguma coisa na alma de um corredor que não se explica, algo como disse Saramago: “Dentro de nós há uma coisa que não tem nome. Esta coisa é o que somos!”
            
Nunca vou me esquecer de que, correndo, me conheço cada dia um pouco mais.

Nunca mais vou me esquecer de que, a cada vez que corro, ficam pra trás muitas sensações, sentimentos, muitas saudades, saudades de pessoas, de tempos vividos, de épocas felizes, até mesmo de ocasiões tristes. 

Cada corrida, para mim, é uma reconstrução. Um recomeço. 

Toda corrida tem seu ritual
Nunca mais direi que é arriscado correr uma distância tão longa. 

Arriscado é não correr riscos. 

Arriscado é se contentar em ficar perto quando você sabe que pode ir um pouquinho além, tão longe quanto conseguir chegar. 

E que posso ir até os lugares que meu pensamento conseguir me levar. 

Sensação da plena liberdade

Eu não corro com as pernas, corro com a mente. 

Minha cabeça me guia.

Completar o percurso é um
momento de êxtase

Nunca mais duvidarei dos que me chamam de louco.

Na corrida, o coração bate no peito do pé

Corredores somos mesmos todos loucos, sendo muitos ou sendo poucos. Mas somos nós: loucos felizes! Loucos saudáveis, se é que isso é possível.

Corredores: "loucos saudáveis"

Nunca mais vou me esquecer das lições que colho do asfalto todas as vezes que corro.

Paisagens deslumbrantes e muita luz no caminho
Nunca mais vou me esquecer das belas imagens que meus olhos podem captar quando corro.

Nunca mais vou me esquecer das sensações incríveis que sinto quando corro.

Nunca mais vou me esquecer de que, nas noites que antecedem as corridas, fico ansioso e não consigo dormir.

Um cenário de arrancar o fôlego

Nunca mais vou me esquecer de toda a preparação que envolve as corridas: o número de peito, o chip de cronometragem, os tênis, o short, a camisa, a meia, o relógio, os tantos que madrugam para chegar a tempo na linha de largada, os aquecimentos, as poses, as fotos...

"Pra onde houver sol" 
Tanta gente. Tantas  pernas. Tantas caras! 

Nunca mais vou me esquecer das tantas vezes que viajo para correr, pois cada viagem é uma corrida e cada corrida uma viagem. 

A corrida me dá asas. 

E, assim, com os pés no asfalto, eu alço vôos cada vez mais altos. 

Pausa para relaxar

Nunca mais vou me esquecer de que, correndo, tento ter mais paciência para pensar, que assim posso definir meus planos e projetos de vida – ainda que eu não saiba ainda quais são meus planos e projetos de vida – elaborar minhas estratégias para viver melhor.

Nunca mais vou me esquecer de que, durante a corrida, tem sempre alguém ao meu lado para contar suas histórias de superação.

Cada um tem sua história
de superação

Nunca mais vou me esquecer de palavras como superação, dedicação, entusiasmo, força, fé, foco, determinação, vontade, autoconfiança, autoestima, tesão, amor. 

Eu corro com tesão. Eu corro com amor! 

Correr é fazer amor com a vida!

Correr para transpirar e inspirar
Nunca mais vou me esquecer de que corro tanto pela vida, mas, que, paradoxalmente, corro para desacelerar da nossa vida tão corrida. 

Nunca mais vou me esquecer de que sempre ao acabar uma maratona digo para mim mesmo que nunca mais vou correr uma maratona, mas ao acabar uma maratona sempre sinto saudades de correr mais uma vez.

O sabor da conquista

E espero a próxima corrida chegar.
Porque a vida é corrida. 
Porque a vida é uma corrida sem fim.
Porque a vida é uma maratona. 
E nós os corredores! 

A vitória vem mesmo do fundo da alma



Um abraço a todos.

Boas corridas.

Vamos correr.   




quarta-feira, 1 de maio de 2013

Correr e contemplar


Pai, me ajuda a olhar!

Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovakloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando. Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai: - Me ajuda a olhar!”

                             Eduardo Galeano, em “O livro dos abraços”



Todas as vezes que tenho a oportunidade de correr em meio à natureza -  pisando a grama, na terra, barro ou cascalho – ou por onde tenha uma lagoa ou na orla da praia, diante de toda aquela imensidão sem fim, sinto-me tal como o menino Diego, do livro de Eduardo Galeano.

As coisas são tão belas que fica difícil olhar sozinho.

Nestes momentos, meu desejo era de que todas aquelas pessoas que gosto estivessem ao meu lado para, então, olharmos todos juntos. 

Um ajudaria o olhar do outro.

Pelo segundo ano consecutivo, participei, no último dia 28, da corrida All Limits, na Lagoa dos Ingleses.



O lugar é, realmente, muito bonito. É um convite à contemplação.



Assim como no ano passado, corri com a máquina fotográfica a tiracolo. E tirei fotos entusiasmadamente.

Eu, que encaro a corrida como um prazer e não uma competição, atiro-me, nestas oportunidades, ao deleite, à apreciação do lugar.

Esqueço que corro com um relógio no pulso e até mesmo da cinta transmissora que sempre levo presa ao peito para me certificar dos batimentos cardíacos.
  

Certamente, meu coração bateu mais forte, pois pude presenciar as belezas do percurso, que, na minha modesta opinião, mudou para melhor este ano, ainda que as subidas tenham ficado mais íngremes e pesadas e algumas descidas no meio da terra até certo ponto perigosas. 



Deixo de lado as técnicas da corrida, esqueço de respirar como manda o figurino, corro risco de me desequilibrar e ralar no chão – havia muito cascalho nos trechos de terra - como fez um dos corredores que estavam à minha frente, que pisou em falso num buraco e se espatifou no chão. 


Mas, a alegria e o entusiasmo do sujeito eram tamanhos que, da mesma forma que caiu, ele se levantou e continuou a correr, como se nada houvesse ocorrido.



Estar nestes lugares é, também, uma rara oportunidade de deixar um pouco o asfalto de lado - longe dos carros que passam frenéticos ao nosso lado quando corremos em ruas e avenidas.

É o momento de  sentir o cheiro de mato, ouvir o canto das aves, curtir mais o chão de terra batida, contemplar a lagoa e deixar por ali o estresse que todos vivemos, todos os dias, na vida corrida.

Assim como o menino Diego, também fiquei mudo de beleza, por muitos momentos, quase nem a minha respiração eu ouvia, e quando conseguia falar, repetia sozinho para mim mesmo: nunca mais vou me esquecer deste momento.



Tudo isso ficará para sempre na minha memória.

São instantes em que me sinto embevecido de tanta beleza e que agradeço a Deus por ter me dado saúde, disposição, ânimo e força de vontade para curtir estas maravilhas.  

E continuo seguindo pelo que fala o meu coração, afinal de contas, em meio à natureza, como cantou 14 Bis, em mim é "tão natural ver a cor da estrada e desaparecer".

Correndo.  

Um abraço a todos.

Boas corridas.

Vamos correr.   
  









quarta-feira, 24 de abril de 2013

De pai para filha: quando a corrida se chama amor!


“Dar o exemplo não é a melhor maneira 
de influenciar os outros – é a única.”
 Albert Schweitzer, teólogo, músico, 
filósofo e médico alemão,

Em meados 2003, quando participei da segunda corrida da minha vida (foram nove quilômetros num trecho da lagoa da Pampulha, em uma competição organizada por um clube aqui de Beagá) minha filha ainda estava na barriga da mãe – ela nasceria naquele mesmo ano, no dia 12 de outubro.

Assim que cresceu um pouco e passou a ter noção das coisas da vida, toda vez que eu ia participar de alguma prova de corrida, gostava de levá-la para assistir às competições.

Eu me divertia a valer.

Mais que me sentir motivado para correr e, ao fim da corrida, ganhar uma medalha, meu maior incentivo vinha do fato de saber que, ao cruzar a linha de chegada, lá estaria minha Júlia a me receber com um abraço apertado e beijos.  

Naquele momento, eu me sentia não apenas um pai, mas um pai atleta, um pai campeão.

Levá-la às corridas era (é) uma maneira de incentivá-la a gostar de praticar alguma atividade física – não necessariamente a corrida – e, posteriormente, fazer daquilo um hábito.

 
Minhas medalhas eram
motivo de satisfação
também para Júlia
Acredito absolutamente que o esporte é a grande oportunidade para que, não apenas as crianças, mas, todos nós, possamos dar conta das nossas infindáveis possibilidades diante da vida.

Pelo esporte, aprendemos a crescer.

Pelo esporte, lidamos, a todo momento, com obstáculos e dificuldades e, no decorrer deste aprendizado, somos estimulados a ter a autoestima elevada, a acreditar em nosso potencial, na nossa capacidade de superação.

Pelo esporte, podemos despertar aquele poder adormecido dentro de cada um de nós.

Levar a Júlia às corridas, é, também, uma forma de ratificar aquela máxima, segundo a qual muito mais importante que falar é o exemplo que damos. 

E parece que a coisa vem dando certo.

Acho que de tanto presenciar minhas freqüentes saídas para correr, minha filha acabou por despertar o desejo de experimentar a coisa.

Foi assim em 2012, quando a inscrevi para participar de uma prova exclusiva para  crianças, em Lagoa Santa.


Júlia ficou muito tensa em
sua primeira corrida 

A experiência para ela não foi das melhores. Assim que romperam a faixa da largada,  todas as crianças (divididas por faixas etárias ) saíram feito loucas, desesperadas, correndo por correr, sem técnica alguma, mas com muito coração – se não me falha a memória, a distância era de uns 200 metros.

Júlia chegou ao final da corrida exausta, ofegante, quase tremendo.

Estava tensa e com ares de decepcionada, embora com a medalha nas mãos. 

 
Primeira medalha
teve um sabor
meio estranho 
Penso que ela, para me agradar, achava que seria possível chegar em primeiro lugar, embora eu sempre dizia a ela que mais importante que ganhar era participar e vivenciar o momento gostoso do esporte.

E dava a ela meu próprio exemplo dizendo que eu nunca cheguei em primeiro lugar e sei que não chegarei, afinal, além de não ter qualquer preparo para isso, não corro para ganhar, corro para viver a emoção de estar ali. Corro para contemplar. Corro por prazer.

Após a prova, ela disse que não ia correr nunca mais.

Ainda assim não deixou de admirar minha paixão pela corrida e nem tampouco de me incentivar.

E foi lindo quando, há menos de dois anos, me brindou com um livro chamado “Era uma vez um corredor”, de John L. Parker Jr, que conta a trajetória de um atleta que dedicou sua vidaa atingir marcas expressivas na corrida. Ela fez questão de frisar  que havia comprado o livro “com o dinheiro dela”.       


Júlia me deu um livro que conta
histórias de um corredor determinado

O presente veio acompanhado de um bilhete, pintado por fora e escrito à mão, assim:

De: Juju
Para: Papai  

Pai eu te amo muito do fundo do meu coração. 
Eu sei que você também me ama muito e adora corridas e por isso eu comprei com meu dinheiro este livro para você com o nome de Era uma vez um corredor. 
Acho que você vai amar este livro e vai ler 1.000 vezes (hehe)
Bjs.
Juju.


Presente veio acompanhado
de um lindo e amável bilhete

Babão que sou – e acho que não é para menos – chorei e me emocionei bastante. Ali, naquele momento, mais uma vez, tive a certeza de que ser pai é, para mim, a coisa mais bonita, mais mágica e notável que já aconteceu na minha vida.

É o que me move, o que me leva adiante – quem é pai (ou mãe) e gosta desta tarefa que é das mais difíceis da vida sabe do que estou falando.

Quando eu pensava que nunca mais ela iria correr, semanas atrás, acabei surpreendido com uma pergunta da Júlia.

- Pai, sabe aquela corrida que eu participei aquela vez em Lagoa Santa? Não tem ela de novo não? Eu quero ir!

Então, entre surpreso e feliz, tratei logo de começar a olhar o calendário de provas infantis. 

No último dia 22, ela
voltou a correr

Descobri três. Já a inscrevi para participar de todas.

Uma delas, aqui em Beagá, Júlia já correu no último dia 22, na Pampulha, num percurso de 200 metros.


Júlia estava leve e entusiasmada
 Foi show.  

Momento de satisfação
e muito amor
Desta vez, empolgada, ela correu leve e feliz, menos tensa.

Acho que curtiu. 


Chegou exausta, ofegante, entretanto, satisfeita.

Muito bacana também ver tantas crianças presentes na corrida, sendo incentivadas a praticar esportes. Isto é mesmo uma coisa notável.


Emocionado também fiquei quando vi que a Júlia, na noite anterior à corrida, fez exatamente o que eu (e  acredito que muitos corredores também) costumo fazer: colocou nos pés da cama, bem separadinho, o tênis novo que a mãe havia comprado para ela correr, o par de meias e a bermuda também nova.


E ela tem estilo pra correr

Ficou apenas à espera da camisa da prova, que pegou momentos antes da corrida, e que exibiu como um troféu, feliz.

Pegar a camisa da corrida
foi como receber um troféu 

Há tempos tenho dito que a corrida tem me oferecido coisas maravilhosas pela vida afora: mais saúde e disposição; um importante ganho físico, mas, sobretudo, mental; a possibilidade de conhecer muitos e novos lugares lindos; a oportunidade mágica das novas amizades, afinal tenho conhecido pessoas maravilhosas, guerreiras e lutadoras, com as quais troco conversas, experiências e idéias e depois posso contar suas histórias. São coisas muito bonitas que acredito terem o poder de engrandecer qualquer pessoa. Não podemos perder a ternura da vida.

Quando vejo minha filha correndo – meio que se espelhando no exemplo que posso lhe dar – comprovo que não há preço que se pague por isso.
Júlia com a medalha:
cansada, mas feliz

 Sinto que devo correr ainda mais.

Sinto que se há um motivo especial que me faça correr, ele tem nome: amor!

As corridas são quilômetros infinitos de amor.

Muito amor pra todos nós.

Vamos amar!

Muitas e ótimas corridas para todos nós.

Vamos correr!

Um abraço a todos e até a próxima corrida.



quinta-feira, 4 de abril de 2013

A cada vez que corro


A CADA VEZ QUE CORRO



A cada vez que meus pés

correm e percorrem as ruas, 

meu olhos veem 

que toda paisagem muda.





A cada vez que meus pés correm 

e percorrem as ruas

minha memória lembra

do que nunca esqueceu.



A cada vez que meus pés correm 

e percorrem as ruas

me recordo das 

tantas corridas 

da vida dessa 

nossa vida 

tão corrida.





A cada vez que meus pés correm e 

percorrem as ruas 

já não sou agora

quem um dia 

fui outrora.



A cada vez que meus pés correm e 

percorrem as ruas pareço 

me distanciar de quem fui

e tento me encontrar 

em quem sou.




A cada vez que meus pés correm 

e percorrem as ruas

percorro-me.



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