terça-feira, 1 de maio de 2012

30 k sem pódio de chegada!


O que faz um corredor no 1º de maio, Dia do Trabalhador? A resposta é óbvia: corre, afinal, um corredor é, também, um trabalhador das pistas, das ruas e avenidas, do asfalto, da terra e da grama, das cidades e do mundo.




E, ao invés de descansar, um corredor, na verdade, faz do feriado mais um motivo para colocar as pernas nas ruas e treinar mais um pouco.


Foi o que resolvi fazer hoje, adicionando, no entanto, uma pitada a mais de esforço: se, na semana passada, consegui romper a barreira dos 25 quilômetros em um treino, hoje fui um pouco mais além e completei um percurso de 30 quilômetros, o que, realmente, não é tarefa das mais simples.  


Nestas horas é que penso como devemos reverenciar todos aqueles que se dedicam a correr, sejam os tradicionais 5 km, mas, sobretudo, aqueles monstros que conseguem a imensa e incrível façanha de correr os 42 quilômetros de uma maratona ou muito além disso.


De fato, não é para qualquer um.


Penso que meu estímulo por tanto esforço hoje muito se deve ainda à impressão causada pela entrevista com o senhor Antônio Marques da Silva, corredor de 67 anos com quem conversei após a Meia Maratona e a Maratona da Linha Verde, no último domingo (29), e que serviu como personagem para ilustrar, neste "Corrida em prosa e verso", o lado humano das figuras anônimas que engradecem as corridas pelo país afora.


Na minha modesta opinião de corredor amador, ainda não tão experiente assim, - com a Linha Verde completei apenas minha terceira meia maratona, ao passo que seu Antônio chegou à sua 87ª  maratona - exemplos como o de um homem desta idade, com tanta disposição, ânimo, força de vontade e saúde, não devem ser negligenciados, particularmente pelos amantes da corrida ou por aqueles que pretendem entrar pela porta da frente neste mundo.


Na verdade, penso até que deveria ter descansado um pouco mais após a participação na meia da Linha Verde, prova que me exigiu bastante do ponto de vista físico, principalmente - como muitos corredores já haviam dito, esta corrida é bastante desafiadora e uma das mais difíceis do país. 


Não sei quanto aos demais colegas, sobretudo aqueles que correram esta prova pela primeira vez, mas digo que ainda hoje, dois dias após a prova, aquela subida que antecede o bairro Guarani, lá pelo 12º quilômetro, ainda faz minha panturrilha miar - um chiado, que, no entanto, mistura dor e prazer, ao mesmo tempo.


Aliás, correndo tanto, acabei desenvolvendo uma técnica própria de muito sucesso, que preparei para aplicar nas subidas das provas que disputo. Esta técnica - que consiste em impulsionar o tronco para frente e, simultaneamente, aumentar as passadas - tentei aplicar também na meia maratona da Linha Verde. Assim, pensei que ganharia em velocidade e ultrapassaria muitos dos meus amigos corredores. 


Deu certo em alguns momentos, mas, na maioria deles, deu tudo errado (eu tinha falado que a técnica era de "sucesso", né?).


Noves fora as brincadeiras, fiz um treino bem interessante hoje. 


Tal  como cheguei a pensar durante as subidas da Linha Verde, me fiz a tradicional pergunta que tantos fazem quanto se veem em situação de desespero ou de engano por uma escolha - a tal de "o que eu estou fazendo aqui" - cansei muito, minhas pernas doeram, mas, a cada vez que eu via uma plaquinha de marcação da quilometragem ficando para trás e meu objetivo se aproximando deliciosamente, eu me esforçava mais um pouquinho.




E, enfim, deu tudo certo.  


Fechei meus 30 primeiros quilômetros correndo, sem pódio de chegada - afinal era apenas um treino -  e sem beijo de namorada - que, imagino, ainda por volta das 6h20 da manhã, quando cheguei à Pampulha hoje, devia estar contando os últimos carneirinhos no sonho.


No fim de tudo, fiquei com duas certezas: a primeira é de que acho que sou, realmente, um pouco exagerado (ou obstinado, como queiram) e a segunda é que, se eu treinar com dedicação, me cuidar, com uma alimentação adequada, etc e tal,  penso que poderei participar de uma maratona e completar os temíveis 42 quilômetros antes do que eu ando a prever.


Não sei bem até onde posso chegar, mas a corrida promete me levar cada vez mais longe. E cada vez mais longe eu irei, conforme minha capacidade e minha saúde permitirem.


Um abraço e ótimas corridas a todos.


Vamos correr!






Eduardo Durães
(Todos os direitos reservados)

domingo, 29 de abril de 2012

Nas esquinas da vida, as histórias de um corredor!


Em Samba da Benção, o poeta Vinícius de Moraes sentenciou: "...a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida!"
Inevitável não me lembrar destes lindos e profundos versos para falar de um encontro que, como na canção,  brotou de mais um dos desencontros dos tantos que a vida - este bem raro e preciso - nos reserva a cada dia da nossa existência.


E foi numa das esquinas da vida, precisamente na avenida do Contorno, ao lado da Rodoviária que, na manhã do último sábado (28), o encontrei, tão perdido quanto eu.
Ambos não sabíamos que direção tomar para encontrar o endereço que procurávamos - interessante notar como, no correr dos tempos, os integrantes das mesmas tribos sociais (aquelas que têm algo em comum) se reconhecem. Isso acontece com os punks, os nerds, os torcedores dos times, os metaleiros, os ciclistas e... com os corredores, claro.
Logo, reconheci naquele homem um corredor de respeito, experiente, o que notei pelos cabelos brancos, que me pareceram sinal de maturidade - ainda que nem sempre denotem isso.
Este (des)encontro inusitado  fez com que, a partir daquele momento, nos tornássemos irmãos na busca pelo lugar onde seria feita a entrega do kit para a Maratona e Meia Maratona da Linha Verde, disputada neste domingo (29).
Agora, no entanto, já acredito que uma bonita amizade nasceu!



Carismático e falante, logo me interessei pelas histórias de corredor do seu Antônio Marques da Silva, que descobri, na breve conversa, ser um honorável senhor de 67 anos, natural de Lavras, no Sul de Minas, a 230 quilômetros da capital. 
Quando muitos nesta idade já não têm ânimo, disposição e força de vontade ou até mesmo saúde, seu Antônio estava ali para pegar seu kit e, pasmem, participar de sua 87ª maratona (e eu me sentindo muito feliz porque iria disputar minha terceira meia maratona).  
Interessado no lado humano desta história, esqueci por momentos que eu era um corredor, deixei meu lado jornalista falar mais alto e pedi a ele para me conceder uma entrevista no dia seguinte, antes da corrida. 
Foi o que ocorreu, mas depois da corrida! 
Foi uma correria para encontrá-lo. 


Os bastidores do encontro

Encontrei seu Antônio no hotel  em que ele estava hospedado na avenida Santos Dumont, no centro de Beagá.
Esperei, com muita ansiedade, (eu estava muito eufórico para conhecer o restante daquela história) por cerca de meia hora, até que meu entrevistado chegou ao hotel, já por volta das 11h30 - quase cinco horas e meia após o início da corrida, que ocorreu às 6h30.
Depois de me pedir um tempo para tomar um banho - mais do que merecido, aliás, afinal, seu Antônio havia completado os 42 quilômetros em 3 horas e 26 minutos. "Meu tempo foi ruim", ressaltou. 
Fiquei pensando se o tempo tivesse sido bom, então, para um homem daquele idade, "dono" de cerca de 450 medalhas, número que apresentou sem muita certeza.


As belas lições que este forte senhor de 67 anos me passou - nas quais se sobressaíram o jeito humilde e a simplicidade dignas de um verdadeiro ser humano, o esforço e dedicação contínuos, a persistência, o vigor, a disciplina, o amor a uma causa (à corrida) e à vida - me presentearam, na verdade, como um dos momentos mais bonitos e tocantes que a corrida tem sido capaz de me proporcionar.
Casado, pai de quatro filhos, "dois deles com curso superior, sendo um fazendo doutorado", ressaltou, e com três lindas netinhas, seu Antônio diz que todo o apoio que tem vem da família e de Deus, que é "a força maior".


ENTREVISTA

"Idade é vida e experiência"


Na entrevista a seguir, seu Antônio - que hoje é aposentado (foi mecânico de manutenção de máquinas pesadas) -  lembra saudoso do tempo em que começou a correr, fala da frequência dos treinamentos para as corridas, dá dicas para quem quer começar a correr, ressalta a importância de uma orientação médica adequada e sentencia: "Não pode  desanimar! Idade nós temos que encarar!


Quando é que o senhor começou a correr maratonas e porquê?
Foi a partir de 1979, mas não tenho documentação daquela época, pois a organização só dava um jornal que, dez dias depois, se desmanchava. Comecei a correr quando estava no Exército, e já praticava muitas modalidades esportivas, inclusive o taekwondo, mas nem me lembro a faixa em que parei. Acho que foi na preta. Eu já pratico esportes há quase 43 anos.






Quantas maratonas o senhor já correu até hoje e em que lugares?
Com a Linha Verde, completo 87 maratonas. E tenho quase o mesmo número de meias-maratonas. Não gosto de correr provas de 10 quilômetros. Eu já corri maratonas aqui em Belo Horizonte, Santa Catarina, Curitiba, Porto Alegre e São Paulo, onde eu fiz meu melhor tempo até hoje em maratonas, 3 horas e seis minutos, em 2011.


Seu Antônio já participou de 87 maratonas em várias cidades 
do país e fez o melhor tempo em uma prova disputada em São Paulo: 
correu 42 km em 3 horas e seis minutos


Como são os treinos e a preparação do senhor para participar das maratonas?
Eu treino seis dias por semana e descanso apenas aos domingos. Corro de 150 a 160 quilômetros por semana, incluindo os longões (os treinos com maior distância). Quando estou envolvido na preparação para a maratona, corro, em média, 38 quilômetros por dia. Mas é muito variável a situação, normalmente corro de 25 a 26 quilômetros diariamente. E minha preparação inclui também ir à academia, pois preciso fazer fortalecimento muscular para a panturrilha e o abdômen, principalmente porque sou "pesado". Tenho músculos que não acabam. Tudo isso é importante para a corrida.


"Quando estou envolvido na preparação para a maratona, 
corro, em média, 38 quilômetros por dia."


Que dica o senhor dá a quem quer começar a correr?
Tem que começar do zero, como a gente começa tudo na vida. Se você vai começar a correr, a primeira coisa a se fazer é passar por um bom médico, fazer uma avaliação completa, incluindo todos os exames de patologia, procurar um cardiologista, um ortopedista e nutricionista. Só não tenho orientador. Sou eu mesmo quem me orienta. Eu sou meu treinador. Mas faço questão de ressaltar todo mundo que me apoia, principalmente meus médicos e todos que, agora, não conseguirei lembrar.


É admirável o senhor, nesta idade, praticar esportes com tanta regulidade e intensidade. De onde tira tanta disposição?
A primeira coisa a se fazer é ter um grande respeito por limites e um bom acompanhamento médico, como eu disse, porque não se pode brincar. A corrida é fatal. Por isso, é preciso ter uma boa alimentação, tomar muito líquido, ter um com acompanhamento médico e, principalmente, muita disposição para treinar. Não pode desanimar. A idade nós temos que encarar. Idade é vida, experiência, tempo e convivência.


SAIBA MAIS 

Maratona: 25 mil passos repetidos numa superfície dura



Apenas como um detalhe, vale destacar que as principais maratonas do mundo são disputadas exclusivamente no asfalto - ou seja, uma corrida de 42 quilômetros e 195 metros com um impacto muito repetitivo sobre um terreno duro. 
Os especialistas no assunto dizem que correr uma maratona corresponde a dar mais ou menos 25 mil passos, colocando uma força de 3 ou 4 vezes superior ao peso corporal. 
Ou seja, quem se habilita a correr uma maratona, precisa ter um preparo  enorme. 
O seu Antônio tem!



Eduardo Durães
(Todos os direitos reservados)